FAKE NEWS E BRAIN ROT: O PREÇO DO CONTEÚDO SIMPLISTA NAS PLATAFORMAS DIGITAIS
- Mariele Santos
- 4 de dez. de 2024
- 2 min de leitura
Atualizado: 6 de fev.

O conceito de “cérebro podre” e o debate sobre a regulamentação das redes sociais estão profundamente interligados. Segundo pesquisadores do Dicionário Oxford, a procura pelo termo cresceu 230% entre 2023 e 2024, possivelmente devido à “preocupação com o impacto trazido por tantos conteúdos de baixa qualidade on-line”.
“Brain rot”, ou “cérebro podre”, refere-se à deterioração mental ou intelectual causada pelo consumo excessivo de conteúdos superficiais e pouco desafiadores, especialmente aqueles provenientes das redes sociais. Esse fenômeno evidencia como o consumo desenfreado de conteúdo digital pode afetar negativamente o bem-estar individual e social. Um exemplo claro são as fake news, que têm fortalecido narrativas autoritárias e causado crises sociais graves.
Diante dessa repercussão, a Itatiaia conversou, em julho, com Helian Nunes de Oliveira, professor e pesquisador do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da UFMG. O especialista em psiquiatria explicou que o termo “cérebro podre” pode estar associado a transtornos mentais.
“Não é um distúrbio mental, mas pode ser sintoma de algum transtorno mental, como depressão, ansiedade e outras alterações. Há uma maior evidência dessas alterações comportamentais porque o uso da internet e mídias sociais tem aumentado, e ainda é difícil o acesso à informação de qualidade. As pessoas gastam muitas horas diariamente sem destino nesse acesso facilitado que a vida on-line trouxe nas últimas décadas”, explica Oliveira.
Apesar de a condição ser facilmente compreendida pela tradução, muitas pessoas com “brain rot” não conseguem evitá-la. “Curiosamente, mesmo que as pessoas tenham consciência da deterioração cerebral, não conseguem fugir dela. Podem estar buscando uma anestesia para algo que já não está indo bem”, afirma o professor.
No Brasil, a necessidade de regulamentação das plataformas digitais ressalta o impacto sistêmico desse fenômeno. Na Câmara dos Deputados, o projeto de lei das fake news teve sua tramitação paralisada e foi remetido a um grupo de trabalho instalado em junho, sem avanços desde então.
No Judiciário, a regulação é tratada como uma forma essencial de enfrentar discursos de ódio, a difusão de desinformação e conteúdos antidemocráticos propagados nas plataformas. Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) têm se manifestado publicamente sobre a necessidade de estabelecer regras para o funcionamento das redes sociais e a gestão dos conteúdos publicados na internet. Um dos principais defensores dessa posição é Alexandre de Moraes, relator das investigações sobre fake news, milícias digitais e os atos de 8 de janeiro.
Esse cenário moderno dialoga com as reflexões de Henry David Thoreau, que, em 1854, já criticava a superficialidade intelectual. Em Walden, Thoreau valorizava o trabalho artesanal e a conexão profunda com ideias e ações humanas, alertando contra uma vida dominada pela mecanização e desconexão. Assim como ele via o trabalho como a expressão de uma “energia divina” intrínseca ao ser humano, podemos interpretar a busca por conteúdos enriquecedores como uma forma de resistir à “podridão cerebral” promovida pela banalização digital.
As redes sociais, em sua configuração atual, representam um espaço onde a humanidade corre o risco de perder sua essência reflexiva devido aos estímulos diários. Regular essas plataformas é um passo crucial para restaurar a qualidade dos debates públicos e proteger o bem-estar mental coletivo.
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